Vaticano amplia lista de pecados capitais

Um fato chamou a atenção da imprensa mundial nesta semana: a divulgação, pelo Vaticano, de uma lista contendo seis novos pecados mortais. A partir de agora, a pedofilia, o aborto, a manipulação genética, a poluição ambiental, o uso e tráfico de drogas e as injustiças sociais passam a compor o rol dos temíveis “pecados capitais”, ao lado da soberba, avareza, luxúria, ira, gula, inveja e preguiça. Publicada na edição do último domingo (09/03) no jornal do Vaticano L’Osservatore Romano, a nova lista foi apresentada depois que o Papa Bento XVI chamou a atenção da Igreja para o que ele considera "queda do sentimento de pecado no mundo secularizado". Em mais de dois mil anos de cristianismo, esta é a segunda vez que um Papa dispõe sobre a tábua de pecados da Igreja: antes de Bento XVI, apenas Gregório I, no século VI, havia realizado tal empreitada.

Pecados Sociais

Note-se que na lista dos “novos pecados” foram incluídas as chamadas “culpas sociais” (a manipulação genética, a poluição ambiental, o uso e tráfico de drogas e as injustiças sociais).

“A atenção ao pecado agora é mais urgente devido aos reflexos maiores e mais destruidores que pode ter”, comentou em entrevista ao L´Osservatore Romano o monsenhor Gianfranco Girotti, Regente da Penitenciaria Apostólica, mais antigo organismo da Cúria Romana. “Se no passado o pecado tinha uma dimensão demasiadamente individualista, hoje possui uma valência, uma ressonância sobretudo social, por causa do grande fenômeno da globalização”, afirmou.

Para quem não está habituado à estrutura da Cúria Romana, vale uma explicação: a Penitenciaria Apostólica é o órgão máximo do Vaticano em matéria de Fórum Interno. Cuida de pecados, censuras, irregularidades, de maneira geral, e também de situações particulares, como dispensas, liberações e convalidação de atos nulos. Também examina e resolve casos de consciência que lhes são propostos (aborto, sacrilégios, indulgências plenárias) e dúvidas em matéria moral e jurídica.

No Brasil, a notícia sobre os novos pecados mereceu destaque na mídia televisiva, ainda que de maneira superficial. A edição do telejornal “Bom Dia Brasil”, da Rede Globo, que foi ao ar nesta segunda-feira, dia 10, chamou a atenção dos telespectadores para a seguinte matéria: “Igreja aumenta lista de pecados e revela que católicos estão confessando menos”.

Na reportagem, a emissora carioca enfatizou o resultado de pesquisa encomendada pela Igreja, mostrando que 60% dos católicos deixaram de lado o hábito de se confessar. “Para combater a crise do confessionário, o Vaticano quer sacerdotes mais atentos e penitência para as faltas graves, o que vai dar mais trabalho para os religiosos, já que a lista de pecados acabou de aumentar”, comentou um dos apresentadores, esquecendo-se de salientar a evidente ligação entre os novos pecados instituídos pela Igreja e o atual contexto social causado pela globalização.

“Mais do que em si mesmo, o mal está sobretudo no efeito social que encerra”, disse o porta-voz da Conferência Episcopal Portuguesa, D. Carlos Azevedo, ao comentar o assunto da “nova lista” com o jornal lusitano Correio da Manhã.

Destaque-se, por fim, que a preocupação da Igreja Católica com os pecados de índole social não é coisa recente. Desde 1979, em Puebla, o Episcopado Latino-Americano alerta para esse grave desvio da fé cristã: “Vemos, à luz da fé, como um escândalo e uma contradição com o ser cristão, a brecha crescente entre ricos e pobres. O luxo de alguns poucos converte-se em insulto contra a miséria das grandes massas. Isto é contrário ao plano do Criador e à honra que lhe é devida. Nesta angústia e dor, a Igreja discerne uma situação de pecado social, cuja gravidade é tanto maior quanto se dá em países que se dizem católicos e que têm a capacidade de mudar: "que se derrubem as barreiras da exploração ... contra as quais se estraçalham seus maiores esforços de promoção" (João Paulo II, Alocução Oaxaca 5 AAS LXXI p. 209). Comprovamos, pois, como o mais devastador e humilhante flagelo a situação de pobreza desumana em que vivem milhões de latino-americanos e que se exprime, por exemplo, em mortalidade infantil, em falta de moradia adequada, em problemas de saúde, salários de fome, desemprego e subemprego, desnutrição, instabilidade no trabalho, migrações maciças, forçadas e sem proteção” (Conclusões de Puebla).

CURIOSIDADES:


Definição de pecado

A definição de pecado, segundo o Magistério da Igreja, é bastante abstrata. Para o Catecismo, pecado é "uma palavra, um ato ou um desejo contrário à lei eterna”, uma ofensa a Deus, capaz de ferir a natureza do homem e ofender a solidariedade humana. Para a Igreja, “a raiz de todos os pecados está no coração do homem”, no seu livre arbítrio (CIC, 1873).

As espécies e a gravidade dos pecados

Para a tradição cristã, há dois tipos de pecado: o venial e o mortal. O primeiro constitui uma desordem moral, reparável pela caridade. É menos grave que o segundo, pois este pode levar o pecador à “morte eterna” (separação eterna de Deus; o mesmo que "inferno"), caso não haja arrependimento.

Para que um pecado seja considerado mortal (grave) pela Igreja, faz-se necessária a concorrência de três elementos, a saber: a) que tenha como objeto uma matéria grave; b) que seja cometido com plena consciência pelo indivíduo; e, por último, c) praticado de forma deliberada. “Escolher deliberadamente, isto é, sabendo e querendo, uma coisa gravemente contrária à lei divina e ao fim último do homem, é cometer pecado mortal”, ensina o Catecismo. “Este destrói em nós a caridade, sem a qual é impossível a bem-aventurança eterna” (CIC, 1874).

* Equipe Pascom

 

Nota:

1 - Para saber mais sobre as culpas ou pecados sociais, consulte a sessão "Formação" em nossa página na internet (coluna à esquerda) e confira o excelente artigo escrito por Dom Genival Saraiva, bispo de Palmares/PE.
 

Fontes:

1 - Catecismo da Igreja Católica

2 - Jornal Correio da Manhã, edição desta quarta-feira, 12 de março. Disponível em http://www.correiomanha.pt/noticia.asp?id=281387&idselect=10&idCanal=10&p=200

3 - Sobre a entrevista do monsenhor Gianfranco Girotti ao jornal L´Osservatore, consultar: http://noticias.cancaonova.com/noticia.php?id=253890.