Será que há vida depois da vida?

De onde, cristãos e espíritas tiram a certeza de que a sua vida realmente prosseguirá depois desta vida? "Temos que ter fé", dizem os cristãos. "Os espíritos nos informaram", dizem os espíritas, proclamando que o fato da aparição de espíritos é uma prova clara de que a vida depois da morte continua.

Só que tais pretensas aparições estão sendo questionadas, hoje, de muitos lados. Psicologia e parapsicologia mostram que a absoluta maioria das assim chamadas aparições de espíritos pode ser explicada, recorrendo a capacidades inconscientes do ser humano. Conteúdos e imagens da pessoa humana estão sendo projetados para fora e materializados, de tal maneira que todas aquelas materializações, aparições e fenômenos, aparentemente produzidos por espíritos, revelam-se, na realidade e diante do olho crítico da ciência, como produtos dos vivos. São eles - e não os espíritos de mortos - que produzem tais fenômenos. De possíveis fraudes e truques nem vamos falar.

E assim estamos de novo diante de nossas dúvidas. A aparente prova de uma sobrevivência após a morte, apresentada pelo espiritismo, revela-se como hipótese cada vez menos corroborada pelos fatos científicos.

Será que com isso devemos simplesmente permanecer no nível de "ter fé", como muitos cristãos dizem? Ter fé é uma atitude profunda e maravilhosa, mas ter fé não conta no mundo da ciência. A ciência quer fatos mensuráveis, observáveis e comprováveis.

Será que existem tais fatos no que diz respeito à questão da existência de uma vida depois da morte? As pressupostas provas do espiritismo desfazem-se e a maioria dos cristãos, de antemão, recorrem ao nível do acreditar, porque a fé não precisa de provas. Mas, são exatamente esses cristãos que, na realidade, dispõem de uma base empírica indiscutível para a sua fé. Eles têm na mão uma prova que resiste a qualquer questionamento científico. Esta prova, que chamo "prova sociológica", consiste no fato de hoje falarmos ainda de Jesus Cristo.

Não só se fala dele, mas um bilhão e meio de pessoas depositam nele toda a sua confiança e toda a sua esperança. Elas fazem isso porque dizem que este Jesus, depois de morto, teria voltado à vida. Sua ressurreição confirmaria, assim, que há vida depois da morte, respondendo exatamente à nossa indagação inicial. É este o núcleo de fé, no qual acreditam todos aqueles que se chamam cristãos.

Mas, a partir de um enfoque científico-crítico, devemos também aqui voltar a questionar: será que Jesus voltou mesmo? Será que todas as narrações sobre a sua ressurreição não são invenção de seus seguidores, que quiseram continuar com suas idéias?

Essa objeção ficaria impossível de ser refutada, caso este Jesus tivesse morrido de uma morte qualquer, caso, por exemplo, tivesse sido decapitado ou liquidado de alguma outra maneira. Mas, a história dele não terminou assim: Jesus foi crucificado e este fato tem um significado muito especial. Isso, porque, conforme a concepção da época de Jesus, a cruz em nada significava um sinal de honra ou de glória, assim como é hoje no mundo cristão. Ser crucificado, na época de Jesus, era a maior vergonha imaginável. Ser crucificado significava o mais claro sinal de um fracasso total.

Ser crucificado, implicava ser rejeitado e negado pelo próprio Deus, conforme o texto chocante de Dt 21,23, onde podemos ler o seguinte: "Maldito por Deus, quem pende na cruz".
Esse Jesus pendia na cruz e, conseqüentemente, era maldito pelo próprio Deus. De um maldito por Deus, porém, nunca mais se pode falar. Era esta a concepção social e religiosa da época. E como conseqüência dessa concepção, um crucificado deixava de ter existido. Um crucificado não existia mais na memória da sociedade e nunca tinha existido. De um crucificado, simplesmente, não se podia mais falar e muito menos daquilo que tinha dito e feito.

Assim era a atitude da época também frente ao Jesus crucificado. A sua morte era uma vergonha e o maior sinal imaginável de fracasso. Esta também era a opinião de seus seguidores e, por causa disso, todos foram embora. Mesmo através dos muitos filtros, pelos quais a tradição passava até ser escrita nos Evangelhos, ainda transparece a decepção insondável de seus seguidores. "Todos ficavam a distância" (Lc 23,49), porque todos, naquela hora, estavam convencidos de que tinham se enganado.

E fora do grupo dos seus discípulos, todos estavam certos de que esse Jesus teria sido um usurpador, um mentiroso talvez, mas, com certeza, não o Messias, porque um Messias não pode ser maldito por Deus.

Assim, foram embora e sobre esse Crucificado caiu o veredicto que pairava sobre todo crucificado: dele não se falava mais.

Se a história de Jesus tivesse terminado com a cruz, também hoje, ninguém falaria dele, porque, naquela época, depois da cruz, era simplesmente impossível pronunciar o nome do crucificado. Só que hoje, nós falamos de Jesus. Não só falamos, mas ele se tornou a pessoa com a maior influência histórica de todos os tempos.

Ter fé é uma atitude profunda e maravilhosa, mas ter fé não conta no mundo da ciência. A ciência quer fatos mensuráveis, observáveis e comprováveis.

Como tal fato é possível, frente ao veredicto apresentado acima?

A única explicação possível para tal fenômeno é que, depois de sua morte na cruz, depois de seu óbvio fracasso aos olhos de todos, aconteceu algo tão grandioso, tão chocante, tão absolutamente novo, que até foi possível voltar a falar dele, "apesar" da cruz; apesar do veredicto bíblico e apesar da proscrição social e religiosa. Deve ter acontecido algo que era maior que tudo isso. Maior que toda a tradição de séculos, maior que todos os veredictos da época.

O que foi este acontecimento totalmente único?

Todas as testemunhas que, na época, voltaram a falar dele, apesar da cruz, são unânimes em confirmar que tal evento inimaginável realmente aconteceu. E todas as testemunhas declaram o fato de que esse Jesus, depois de sua morte, voltou vivo. Ele ressuscitou.

A ressurreição tornou-se a grande prova de que Jesus, contra todas as aparências da cruz, não tinha fracassado, de que ele era o Messias, de que Deus estava com ele e não com o Templo que o tinha crucificado. Se essa ressurreição não tivesse acontecido, nada disso poderia ter sido provado.

Assim, porém, voltou-se a falar dele, a sua mensagem continuou, apesar da cruz, porque ele ressuscitou da morte. Deus o ressuscitou, e de um ressuscitado era possível voltar a falar.

Esta ressurreição, além de todo o seu significado teológico, traz assim uma prova, empiricamente mensurável, de que, depois da morte, a vida continua. Porque esse Jesus estava morto mesmo, mas voltou da morte e viveu. Se, porém, podia voltar da morte, então a morte não significa a aniquilação da pessoa.

A vida vai além daquilo que chamamos morte. A prova disso é o fato de que Jesus voltou da morte, e a prova empírica que ele realmente voltou é o fato de hoje falarmos dele. Se ele não tivesse ressuscitado, nunca, naquela época, teria sido possível voltar a falar dele. É esta a prova sociológica da ressurreição de Jesus, que, por sua vez, se torna a prova de que, depois da morte, a vida continua ...


* Artigo escrito por Renold J. Blank, doutor em Teologia e em Filosofia, professor titular da Pontifícia Faculdade de Teologia de São Paulo.