Pode parecer delírio ideológico de um esquerdista de classe média - um Zé Mané do tipo “socialista teórico”, “progressista moderado”, “cristão liberal”, se é que é mesmo possível juntar tais realidades numa só criatura –, mas tenho cá com meus botões que o desligamento da Senadora Marina Silva do cargo de Ministra de Estado é uma resposta da petista à política ambígua do Governo Lula na área ambientalista.
Ora, algo não cheira bem na Amazônia e não é de hoje.
Em 2004, os moradores da aldeia Jauari, em Roraima, foram despertados por tiros, gritos, roncos de máquinas e tratores. Os invasores invadiram casas, mataram porcos, galinha e cães, depois marcharam para destruir as comunidades indígenas Brilho do Sol, Retiro São José e Homologação, no mesmo Estado, onde derrubaram 37 casas e incendiaram os escombros, não poupando sequer a igreja, a escola e o posto de saúde. Em seguida, isolaram as áreas e fecharam as estradas. 131 pessoas ficaram desabrigadas. Ninguém foi punido pelo episódio.
Em 2005, a freira norte-americana naturalizada brasileira Dorothy Stang, petencente às Irmãs de Nossa Senhora de Namur, congregação religiosa fundada por Santa Julie Billiart, foi assassinada a tiros, em Anapu (PA). O fazendeiro Vitalmiro Moura, acusado de ser o mandante do crime, acabou absolvido pelo Tribunal do Júri da cidade de Belém. Em nota, dom Luiz Soares Vieira, arcebispo de Manaus (AM) e vice-presidente da CNBB, afirmou: “Estranhamos profundamente o veredicto do Tribunal e acreditamos que a sentença não está de acordo com o processo. Temos confiança na justiça, pois seria muito triste para o Brasil a continuação da impunidade”.
Em abril deste ano, a CNBB divulgou nota manifestando apoio aos bispos do Pará ameaçados de morte (dom Erwin Kräutler, dom Flávio Giovenale e dom José Luís Azcona Hermoso). “Apoiamos seu empenho na defesa do meio ambiente que a ganância devasta com nefastas conseqüências para a vida humana. Suas lutas são, portanto, as nossas lutas, seus sofrimentos são os nossos sofrimentos”.
Terá sido então um simples desalento pessoal ou as “forças ocultas” de sempre provocaram a saída de Marina Silva do Ministério do Meio Ambiente?
Transcrevo alguns depoimentos sobre a ministra, à guisa de reflexão. Disse Rui Prado, presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado do Mato Grosso: "Espero que o próximo ministro não seja tão radical quanto a Marina. Ela era uma barreira para o desenvolvimento econômico do Brasil." Na opinião do presidente da associação mato-grossense dos produtores de soja, Glauber Silveira, "Marina não estava preocupada com o desenvolvimento do país, não que a questão do meio ambiente não seja importante, é muito importante, mas ela nunca pensou no desenvolvimento sustentável, ela sempre pensou no 'não' desenvolvimento", afirma. Outro que se mostrou satisfeito com a saída de cena da ministra foi o ex-deputado Alberto Lupion. Segundo ele, "as propostas que apresentávamos, os problemas como área legal, ela fazia ouvidos moucos. Acredito que o bom senso agora deve prevalecer. O meio ambiente é uma ciência e não deve ser tratado ideologicamente. Ideologia é inimiga do meio ambiente", afirmou.
Há, porém, quem entenda que a demissão da ambientalista representa um desastre para o governo brasileiro. José Cardoso da Silva, vice-presidente para a América do Sul da ONG Conservação Internacional, assevera: “Se o governo tinha uma credibilidade mundial na questão ambiental era por causa da ministra Marina". "As forças mais destrutivas para a Amazônia exigiram a saída dela. O governo Lula deu o Plano Amazônia Sustentável (PAS) na mão do Mangabeira Unger. Isso obviamente foi uma tapa na cara da ministra", adverte Frank Guggenheim, diretor-executivo do Greenpeace. "Uma pessoa que tem o histórico da senadora Marina e que seja um referencial, inclusive lá fora, perante a comunidade ambientalista do mundo, acho muito difícil encontrar substituto à altura. Tomara que o governo não tenha feito a opção do desenvolvimento em detrimento do meio ambiente", pondera o senador Jefferson Peres, do PDT-AM.
Sinceramente, não acredito em acasos nessa história. Concordo com Frank Guggenheim, forças terríveis se ergueram contra Marina. A posição dela no Governo tornou-se insustentável. Penso que a corajosa seringueira - que um dia nutriu o sonho de ser freira, antes de se filiar ao PRC (Partido Revolucionário Comunista), na década de 70 - preferiu sair do Governo a ter que compactuar com o erro.
Como lembram Zé Geraldo e Renato Teixeira, na música galho seco, “quando tudo tá perdido na vida é que a gente descobre que na vida nunca tudo tá perdido”. Saídas honrosas existem e são sempre melhores que o silêncio obsequioso.
Sou, como disse no início, um “esquerdista de classe média”, mas tal não me impede de perceber as coisas como elas são. Parabéns, Marina!
* Artigo escrito por Alexandre José, membro da PASCOM de Santo Antonio.