A vida é uma constante semeadura e colheita. Quem planta sempre espera colher. No campo a expectativa é de que qualquer safra venha abundante, sadia, generosa. Na cidade, espera-se pelos bons frutos do trabalho, seja este de qual nível for. Na vida, todos anseiam por realizar bons sonhos, atingindo ao menos uma aposentadoria confortável, uma velhice digna. E depois?
Aí é que vem a colheita definitiva. Mas a tradição religiosa dos antepassados cristãos mantinha entre seus costumes uma comemoração considerada o auge de todos os seus esforços pela sobrevivência, a Festa da Colheita. A ela acorriam todos os agricultores, cinqüenta dias depois da Festa dos Ázimos ou Páscoa, a lembrança da passagem libertadora. Após a escravidão, a graça da liberdade como povo da predileção divina. Após a liberdade, a colheita. Ou seja, já tinham em mãos os primeiros fardos de trigo ou cevada e deveriam trazê-los ao templo de Jerusalém, como forma de ação de graças. Na linguagem grega, era a Festa de Pentecostes, com origem estritamente agrária, mas teor histórico cuja motivação se alterou no decorrer dos tempos. Associavam-na também às comemorações da promulgação dos Dez Mandamentos e numerosos peregrinos viam nela a sublime colheita das normas para merecimento da liberdade. Após a colheita, a gratidão.
Então Jesus entra na história. Sua vida, semeadura constante. Sua expectativa: colher para o Pai o campo dourado de sua seara, as espigas de sua palavra, que seus seguidores já “debulhavam na mão e comiam” no Dia do Senhor. Porém, com sua ação fiel ao roteiro traçado pelo Plano da Salvação, tudo teria conotação histórica, prevista pelas profecias. “No tempo da colheita (Deus) enviou um servo aos vinhateiros para que lhe dessem do produto da vinha. Estes o feriram e o reenviaram de mãos vazias” Depois enviou um segundo, um terceiro - os profetas que bem conhecemos -, todos ridicularizados e ignorados pela maioria. Até que enviou seu próprio filho, que, reconhecido como herdeiro, foi posto para fora da vinha e morto com ultrajes. A colheita estava feita. Quem semeia vento, colhe...
Cinqüenta dias depois daquela tempestuosa e fatídica tarde, eis que “de repente veio do céu um ruído, como se soprasse um vento impetuoso” (At 2,2). Cumpria-se a promessa: “Eis que vos enviarei um consolador, o Espírito Santo de Deus”. Assim frutificou a Palavra, posta agora nas mãos de novos operários – os seguidores do nazareno – como presente dos céus e com garantias de colheita farta. Essa é a função da presença pentecostal no mundo, cujos frutos são incontáveis como as areias da praia, as estrelas do céu. Age em nós e na Igreja como advogado das nossas causas, consolador das aflições e misérias humanas, paráclito dos mistérios da alma, intercessor das nossas necessidades, mentor das ações proféticas, mediador, inspirador e tudo mais que consideramos necessário para “renovar a face da terra”, a nossa vida.
Felizes os que descobriram em suas vidas essa força interior. Já dizia um artista, Picasso, cujos pinceis rebocados e incertos seguiam uma linha de sua ação, a sensibilidade: “Há pessoas que transformam o sol numa simples mancha amarela, mas há também aquelas que fazem de uma simples mancha amarela o próprio sol”. A presença do Espírito na vida cristã não pode ser um simbolismo apenas, mas a essência da presença de Deus, o próprio Sol, aquele que nos ilumina e aquece, que gera vida em nós, que conta nossos dias, nosso zelo com a semeadura de sua Palavra como o agricultor que anseia pela colheita definitiva. Essa não será propriedade de um apenas, mas de todos os que acreditaram no trabalho, na ação inspiradora do Espírito Santo em suas vidas, para um dia se banquetearem à mesa do Senhor da Messe. Colheremos, então, o que hoje estamos plantando.
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Fonte: Wagner Pedro Menezes
Local:Assis(SP)