Neoliberalismo, eficiência e pastoral - Jung Mo Sung

Um dos desafios sempre presentes nas práticas pastorais das Igrejas cristãs é a dialética de ser enviado ao mundo e nele anunciar com eficiência a Palavra, sem se deixar levar pelo mal do mundo, nem fugir do mundo. O evangelho de João nos coloca este problema desta forma:"Eu lhes dei a tua palavra, mas o mundo os odiou, porque não são do mundo, como eu não sou do mundo. Não peço que os tire do mundo, mas que os preserves do mal. (...) Como tu me enviaste ao mundo, também eu os enviei ao mundo." (Jo 17,14-15.18).

Anunciar com eficiência a Palavra de Deus sempre foi um grande desafio para as Igrejas cristãs. Mas hoje é uma questão crucial. A grande diferença não está tanto na Palavra, que sempre deve ser atualizada com o auxílio do Espírito, mas sim no ítem eficiência. Nunca se falou tanto em eficiência como nos dias de hoje. Tudo gira em torno da eficiência e tudo é justificado ou julgado segundo ela.

1. Eficiência

Para entendermos um pouco melhor esta questão, tomemos o exemplo da desigualdade social. Até os anos 70/80, a desigualdade social foi vista como um mal social a ser combatido pela sociedade e Estado. Assim, o Estado intervinha na economia para aumentar o número de empregos e implementava políticas econômicas e sociais visando melhorar a distribuição de renda e minorar os sofrimentos dos pobres. A partir dos anos 80, com a hegemonia do neoliberalismo, a desigualdade deixou de ser vista como um mal social. Ela é hoje considerada como algo justo, necessário e benéfico, porque é vista como resultado da concorrência no mercado.

Justa porque os ricos e os pobres estão recebendo segundo a eficiência de cada na concorrência do mercado. Necessária porque, segundo os neoliberais, não há outra forma eficiente de organizar a economia das sociedades modernas fora do sistema de livre mercado. Benéfica porque é a desigualdade social que incentiva as pessoas para a concorrência, que é motor do aumento da eficiência.

Em resumo, aquilo que antes era vista como um mal social, passou a ser vista como um bem, em nome da eficiência do mercado. Assim, a sociedade se torna cada vez mais insensível frente ao fenômeno da exclusão social.

O problema é que eficiência é um conceito formal, isto é, vazio de conteúdo. Quando se fala que alguém é eficiente está se dizendo somente que ele atinge os seus objetivos com o menor custo possível. Não está em questão se os seus objetivos são bons ou não. Se uma pessoa é capaz de atingir o seu objetivo de matar milhões de pessoas com o menor custo possível, ela é eficiente.

Quando a sociedade hoje coloca a eficiência econômica como o critério último está pressupondo que a finalidade da vida humana e da sociedade é o crescimento econômico ou a maximização da acumulação de riqueza. O crescimento econômico foi colocado como sinônimo e caminho para qualidade de vida humana. Por isso, o enriquecimento de uma minoria justifica, segundo eles, o aumento da desigualdade social porque gera um maior crescimento econômico. O reino da eficiência é o reino da riqueza quantificada.

A própria busca da "qualidade total", tão falada nos dias de hoje, tem como objetivo último, não o bem estar das pessoas, mas sim o aumento dos lucros das empresas.

2. Pastoral eficiente?

Numa sociedade em que a eficiência econômica foi elevada à categoria de critério último da vida, não é fácil querer anunciar com eficiência a Palavra sem cair no reducionismo perverso do mundo. Afinal, é neste "mar" que vivemos.

Razão porque a oração de Jesus, "os preserve do mal do mundo" é mais atual do que nunca. Infelizmente não é muito raro encontrarmos comunidades eclesiais onde os seus líderes têm como o critério último o aumento quantitativo da comunidade ou da riqueza da Igreja e dos seus membros. Em nome da competência ou eficiência pastoral acabam reduzindo a boa-nova e a santificação das pessoas, da comunidade e da sociedade a um mero cálculo quantitativo. "Programas de qualidade" são implementadas, na maioria das vezes, sem uma devida crítica dos seus aspectos meramente mercantis. Não podemos esquecer que Programas de Qualidade Total foram criados para atender melhor os desejos de consumidores, não para anunciar a Palavra que Cristo confiou às Igrejas.

A grande diferença entre as empresas e Igreja é que as primeiras não têm princípios ou valores a preservar, existem para atender os desejos mutantes dos consumidores. A Igreja, ao contrário, tem, independente da vontade dos "consumidores", algumas verdades e valores que não pode e nem deve renunciar.

Se não percebermos esta diferença fundamental, a vontade de sermos mais eficientes na pastoral pode nos levar ao equívoco de reduzirmos a evangelização ao cálculo de eficiência do mercado neoliberal. Correndo, assim, um sério risco de trocar a virtude da caridade pela insensibilidade frente ao sofrimento do nosso próximo.

Por outro lado, negar simplesmente o problema da eficiência na pastoral também não é solução. Seria mais ou menos querer "sair do mundo" para não ser contaminado pelo mal.

A questão não é eficiência/competência: sim ou não? A pergunta deve ser: que tipos de eficiência pastoral realiza eficientemente a nossa missão de anunciar a boa-nova aos pobres? Por exemplo, que fazemos com um irmão que, apesar de toda boa vontade e santidade, não consegue ser eficiente na comunicação do evangelho? Se o conceito de eficiência é entendido no sentido neoliberal, predominante hoje, este irmão deve ser "deixado de lado" para que não percamos a nossa eficiência. Mas isto não seria negar a prática de Jesus que acolhia, não só os "ineficientes", mas também os pecadores, os pequenos...

Acredito que esta questão é hoje um dos principais desafios prático-teóricos para os pastoralistas e teólogos. Uma coisa parece clara: para nossa missão de evangelização, a eficiência do mercado, "do mundo", não é eficiente.


* Artigo escrito por Jung Mo Sung, professor nos programas de pós-graduação em Ciências da Religião.