Voltar às fontes é urgentíssimo!!
Por Pe. Francisco Almeida
Os anos que antecederam o Jubileu do ano dois mil foram marcados, no Brasil, por um projeto de evangelização chamado Rumo Ao Novo Milênio; de Roma veio o texto: O Advento do Terceiro do Terceiro Milênio. Ambos, sobretudo o primeiro, acentuaram a necessidades de voltar às fontes do cristianismo. A grande motivação para essa tão expressiva e significativa orientação era a consciência da perda dos referenciais originais do movimento de Cristo.
Desde que o imperador romano Teodósio, no final do século IV, tornou o cristianismo religião oficial do império, deu-se início a um processo acelerado de afastamento entre o cristianismo e o projeto de Jesus. O extremo deste afastamento ficou patente em práticas que contaram com a conivência da Igreja Católica e que negavam radicalmente a pregação de Jesus de Nazaré. Simonia, indulgências, inquisição denunciaram o grau de cegueira da Igreja em relação a suas origens e o fascínio pelo poder que havia tomado conta das suas fileiras.
Não obstante este afastamento acentuado, muitos homens e mulheres faziam uma experiência cristã “clandestina”. Na simplicidade de suas orações e práticas iam vivendo o cristianismo com uma essencial santidade que permitiu a invocação dos seus testemunhos como sinal de que, ao lado de uma Igreja arrogante e desviada do projeto do Mestre Jesus, caminhava uma Igreja Marginal que guardava com muita determinação o espírito essencial do movimento de Jesus.
O fim da Idade Média pôs em crise a cristandade. Os novos pensamentos e pensadores, encorajados pelo espírito do seu tempo, evidenciaram os equívocos da pregação cristã e a contradição de suas práticas. Foi impossível, apesar de todos os esforços, impedir que tais pensamentos se espalhassem rapidamente pondo em crise uma hegemonia quase milenar. A Reforma Protestante foi um dos maiores golpes sofridos pela Igreja Católica, sua força se deu, em grande parte, pelo fato de o reformador ter saído de suas entranhas. Após o movimento de Lutero os católicos já não eram os únicos “cristãos”. Foi iniciado um longo, porém frágil, processo de recuperação ou reconstrução da cristandade, chamou-se isso de contra-reforma, cujo ponto alto fora o Concílio de Trento que não conseguiu responder aos anseios e necessidades de renovação da vida eclesiástica. Tal Concílio apostou na refutação, sob ameaça de excomunhão; ao invés de aproveitar a crise para reconhecer os limites e apresentar mecanismos de superação. Apostava-se na reafirmação e no fortalecimento de uma estrutura cambaleante.
Quatro séculos depois, movido pelo Espírito Santo, João XXIII, papa eleito como peça de reposição, convocou o Concílio Vaticano II. Era uma oportunidade única de a Igreja rever sua caminhada e adaptá-la às necessidades do seu tempo. Tudo se fez para boicotar essa intuição do papa bom, não conseguiram, o Concílio aconteceu. Teólogos e bispos da América Latina tiveram uma participação muito importante e contribuíram para que fosse traçada uma linha de reflexão e proposição que tocasse nos reais e verdadeiros desafios do cristianismo moderno. O resultado, apesar de não ser o esperado, foi bastante satisfatório e trouxe consigo uma esperança contagiante. Novas experiências religiosas pulularam por todos os cantos do mundo, de modo especial na América Latina. A hierarquia da Igreja, temendo perder o controle absoluto sobre as práticas e experiências católicas, iniciou um processo apelidado pelo teólogo João Batista Libâneo de “Volta à Grande Disciplina”.
Desde então experiências oficiais têm sido incentivadas e abençoadas pelos líderes do catolicismo. Outras, marginais, têm sido classificadas como danosas à unidade da Igreja, seus idealizadores e membros têm sido duramente criticados e condenados ao “silêncio obsequioso”.
“Sabeis que os governadores das nações as dominam e os grandes as tiranizam. Entre vós não deverá ser assim. Ao contrário, aquele que quiser tornar-se grande entre vós seja aquele que serve, e o que quiser ser o primeiro dentre vós, seja o vosso servo. Desse modo, o Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate por muitos” (Mt 20, 25b-28).
É urgente voltar às fontes porque precisamos aprender de Jesus qual a verdadeira missão dos cristãos:
“O Espírito do Senhor está sobre mim, porque ele me ungiu para evangelizar os pobres; enviou-me para proclamar a remissão aos presos e aos cegos a recuperação da vista, para restituir a liberdade aos oprimidos e para proclamar um ano de graça do Senhor” (Lc 4, 18-19).