A velha edificação de pedra onde eles estavam não era espaçosa

A velha edificação de pedra onde eles estavam não era espaçosa

PARTE I

Havia uma sala retangular, com algumas janelas laterais, e um cômodo ao fundo, onde costumeiramente eram feitas as refeições. Colada à parede lateral, havia uma pequena escada externa que dava acesso ao terraço, também retangular. Finas vigas de madeira ajudavam a sustentar um modesto telhado coberto de palha picada. Dias atrás, naquele terraço, os atuais moradores realizaram a derradeira ceia em conjunto, sob um clima de despedida. A atmosfera agora era outra. A sensação dominante era que algo perverso se aproximava oculto nas sombras para devorá-los. O ar quente enchia o ambiente de suor e medo. Escondidos no interior da modesta residência, os ocupantes permaneciam em silêncio. Um silêncio incontido. Repleto de dor e raiva. Pedro era o mais inflamado de todos. Não conseguia aceitar a morte trágica do amigo. Quanta violência, quanto ódio, quanta selvageria em nome da Lei. Bando de fingidos, de blasfemos, lobos em peles de cordeiro. Na verdade, lobos em vestes sacerdotais. Eram todos traidores. Haviam vendido a própria alma ao demônio em troca de poder. Mereciam pagar com a própria vida cada gota de sangue inocente derramado. Tais pensamentos enchiam o peito do velho pescador de rancor e indignação. Além disso, ele se sentia particularmente responsável pela morte do Rabi. Ele o negara três vezes, quando confrontado por populares durante o julgamento. Negara o Rabi por pura fraqueza. O sentimento de desonra despedaçava seu orgulho. Era um homem dominado pela vergonha. Maria, ainda abatida, se mantinha em silêncio no canto da sala, rodeada por outras mulheres. A pouca luz do ambiente tornava ainda mais grave o seu semblante sofrido. Em seu coração, ela ruminava antigas lembranças da adolescência, quando o velho Simeão pressagiou algo incomum em seu futuro. Algo semelhante a uma espada. Um fio de espada cortante, dilacerando sua carne. Ela sentia agora a dor de cada palavra antes esquecida. A sensação era a mesma. Um fio de espada atravessando suas entranhas. Destroçando-lhe a alma. Uma ferida aberta. Doída. Seu silêncio, mais que medo, refletia a incapacidade humana de expressar racionalmente o sofrimento diante da morte do filho amado. As mulheres em vão tentavam consolá-la. Maria permanecia quieta, aprisionada em um casulo invisível de agonia, ansiedade, silêncio e pesar. Ansiedade sim, pois algo em seu coração dizia que aqueles eventos terríveis do dia anterior não haviam terminado.

Alexandre Cesar