Surge radiante no horizonte dos inquietos mais um teólogo - Prometeu acorrentado - trazendo à arena discursiva provocações profundamente pertinentes.
Caríssimo Prometeu, como cristão a caminho, tenho me deparado, vez por outra, com atitudes críticas acerca da prática e dos posicionamentos oficiais da Igreja.
As minhas queixas são com relação à estrutura, os métodos e a linguagem. Os princípios que norteiam a pregação e a doutrina são fundamentados (na maioria das vezes, muito bem) nos ensinamentos de Cristo. O problema torna-se gigante quando tais pricípios são traduzidos para a prática eclesiástica.
É óbvio que estamos cansados de saber que, a partir do século IV, a Igreja passou a ser seriamente influenciada pelo estilo de vida e político palaciano; desde então, apesar de todos os revezes da história, não tem conseguido recuperar a sua originalidade. Por isso mesmo, os decretos, as constituições, instruções, encíclicas, etc. trazem consigo, quase sempre, um tom absolutista e impositor. Isso, por si só, é responsável por uma reação contrária. A Dominus Iesus é um claro exemplo dessa situação. A minha pergunta à época foi: Por que um documento com esse conteúdo nesse momento da história, quando o mundo discute e insiste na tolerância, no diálogo entre as grandes religiões?
Uma atitude impensada por parte de quem acostumou-se a encarrar os desafios da evangelização com decretos e proibições. Atitudes simplistas que espalham mais do que ajuntam. Saudades de um tempo que não voltará jamais.
Melhoranças a todos!
Há cerca de uma semana, li o longo comentário escrito pelo amigo Nicodemos, a respeito do livro A Utopia de Jesus, do teólogo argentino Rubén Dri. No comentário, o velho Nicodemos meio que confidenciava antigas lembranças de seu tempo de faculdade e rememorava trechos de um diálogo travado (em uma fila de banco!!) com um velho colega da época. O sujeito era marxista e depois tornou-se evangélico, algo assim. No final, ele diz uma frase que parece resumir toda a história: embora integrante de “outra Igreja” (não recordo se havia aspas no original), seu amigo continuava a mesma pessoa boa de antes, nada havia mudado em seu caráter. Estranhamente, esse artigo sumiu do mural (o que houve?).
Bom, mas a lembrança desse comentário do amigo Nicó traz à baila um tema que considero delicadíssimo e que gostaria de partilhar com os amigos do mural. Como todos sabem, em 2000, o então cardeal Joseph Ratzinger, na época Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, submeteu à aprovação do Papa João Paulo II a Declaração \"DOMINUS IESUS\", versando sobre a unicidade e a universalidade salvífica de Jesus Cristo e da Igreja Católica.
De acordo com esse documento, existe “uma única Igreja de Cristo, que subsiste na Igreja Católica, governada pelo Sucessor de Pedro e pelos Bispos em comunhão com ele\".
Por outras palavras, não existe salvação fora da Igreja de Roma, afirma Ratzinger.
Como era de se esperar, tal Declaração causou inquietação em muitos setores da própria Igreja Católica e gerou nos seguimentos ligados à causa do Ecumenismo um manifesto desconforto, ao enfiar goela abaixo, como verdade de fé, a supremacia da Igreja Católica sobre as demais Igrejas.
Defendendo o conteúdo dessa Declaração, afirma o historiador Orlando Fedeli: “O ódio revelado por alguns teólogos, jornalistas e até clérigos, contra a Declaração Dominus Iesus, que veio proclamar, de novo, velhas verdades de fé, há muito esquecidas, e que o Papa João Paulo II, em boa hora, fez recordar através da citada Declaração do Santo Ofício, tem provocado reações de uma violência inaudita contra a Sagrada Hierarquia. As dez verdades de fé que a Dominus Iesus lembrou - e nas quais todos os católicos, inclusive os Bispos, devem crer firmemente - caíram como sal, que alimenta e dá sabor, sobre as almas fiéis. E caíram como sal sobre os que perderam a fé. E sua raiva impotente, e sua revolta tenebrosa, e seu contorsionado desespero, mostram que eles reagem às verdades da fé como se o sal e o sol da verdade queimassem sua inteligência, e fizessem arder de ódio suas almas. Infelizmente” (Orlando Fedeli. “Revolta, cisma e heresia: reações contra a Dominus Iesus”. Disponível em http://www.montfort.org.br/index.php?secao=veritas&subsecao=igreja&artigo=revolta&lang=bra).
Vale lembrar que Fideli é fundador da Associação Cultural Montfort, instituição civil católica fundada em 1985, cuja finalidade (e aqui reproduzo as palavras do seu fundador) é “a difusão do ensinamento tradicional da Igreja e da cultura cristã ocidental”.
Na outra extremidade, temos a opinião de Lauri José Wollmann, presbítero da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil, para quem “uma leitura mais atenta do documento Dominus Iesus, mesmo sem pretender avaliar todos os aspectos, revela alguns pontos críticos que merecem maior cuidado”.
Lauri José Wollmann é Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma; teólogo formado pela Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma; formado em História pela UNINOVE SP e pós-graduado em História pela Faculdade de Educação São Luis.
Transcrevo a seguir algumas passagens do artigo escrito por Lauri a respeito da Dominus Iesus:
“1. Chama a atenção do leitor a quantidade de citações (102 notas) de documentos, o que em princípio não representaria um problema. Contudo, esta farta fundamentação documentária é tendenciosa, ou seja, utiliza textos cuidadosamente escolhidos para fundamentar as pretensões do documento.
2. A constituição dogmática Lumem Gentium (LG) do Concílio Vaticano II representou com toda a certeza um avanço. Animou a muitos. Resgatou a imagem da Igreja como Povo de Deus e não como “sociedade perfeita”. Igreja que tem como elo de Unidade Jesus, o Filho de Deus, mediador entre o Pai e o mundo. Dentro do documento “Dominus Iesus” esta mesma “Lumen Gentium” é utilizada para garantir e legitimar principalmente que o “papa” é o sucessor de Pedro. A LG que tinha como ponto focal Jesus Cristo como mediador entre Deus e seu Povo, a Igreja como instrumento a serviço do Reino, na argumentação de Ratzinger a Igreja Romana é o Reino. De anunciadora do Reino passa a ser o Reino (cf. o cap. V no. 18). Deixa, portanto, de ser instrumento para se tornar fim.
3. Das 102 notas que tem 19 são da Encíclica Redemptoris Missio de João Paulo II. Este texto em sua proposta original mostrava a missão da Igreja como instrumento a serviço da Evangelização. Na declaração Dominus Iesus este texto é colocado como sustentação da exclusividade da missão conferida à Igreja Romana.
4. Causa estranheza que das 102 notas, apenas uma cita um teólogo deste século. Trata-se de Leonardo Boff. Podemos situar nesta nota duas observações: a primeira está direta-mente ligada a uma questão de relacionamento pessoal entre Ratzinger e Boff; a segunda está em continuidade com a primeira, ou seja, como Ratzinger ocupa cargo que outrora eliminava pela fogueira todo aquele que ousava pensar de modo diferente, ainda que teologicamente correto. Como hoje já não é mais possível simplesmente eliminar os diferentes, este mesmo Ratzinger “inventa” maneiras de eliminação. O livro “Igreja, Carisma e Poder”, que constitui o centro de toda a perseguição de Ratzinger a Leonardo Boff, está em sintonia com outros teólogos, como Hans Küng, Edward Schillebeeckx e tantos outros. Hans Küng, por exemplo, nega que “serviço de Pedro seja sinônimo de papado” (cf. Die Kirche, p.516).
5. Gera certa perplexidade o documento quando se olha para o agir de João Paulo II. Suas viagens são marcadas por encontros com o diferente: muçulmanos, judeus... esforço este que tem uma síntese, ao menos teórica, na encíclica “Ut Unum Sint”. Cabe aqui uma observação: Ratzinger cita apenas três vezes esta encíclica.
6. O documento Dominus Iesus coloca também a seu serviço textos bíblicos, nos moldes mais fundamentalistas possíveis. Evita o texto de Mateus 16.13-20, texto de larga aplicação para justificar o primado de Pedro, preferindo o texto de João 21.15-19. Mas a leitura mais equivocada é quando identifica a Igreja com a videira, lendo João 15.1ss.
7. A materialidade do texto revela a intenção do autor. Apenas a Igreja Católica de Roma é considerada Igreja, sempre grafada em letra maiúscula, enquanto que as outras nem sequer são chamadas de igrejas”.
Ao final do artigo, o autor afirma:
“3. Ao afirmar a superioridade e exclusividade da Igreja de Roma, chamando para si a responsabilidade da salvação, temos duas conseqüências imediatas: a) a volta para o tempo do “extra ecclesiam nulla salus”; b) todos os esforços realizados em prol do ecumenismo e seus resultados foram relativizados. Concordamos com Dom Glauco Soares de Lima, Bispo Primaz da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil, que afirmou: “Estou convencido de que a Unidade dos cristãos, a Unidade da Humanidade, é uma construção que está sendo feita nas bases das igrejas e não nas suas cúpulas, por melhor que elas sejam. Assim, independente das notas, decretos, encíclicas etc, vamos continuar a construção, que é um processo de amor orientado pelo Espírito Santo que se manifesta em nós”. A mesmo tempo que concordamos, alertamos para as implicações que o documento traz. Trata-se de um documento emitido pela Congregação Para a Doutrina da Fé e tem, ao mesmo tempo, o aval de João Paulo II. Considerando o episcopado e o clero gerado no tempo de João Paulo II e a “fidelidade cega” destes, as conseqüências não serão tão tênues. 4. Fica ainda uma pergunta de ordem prática: como será o relacionamento interno do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs (CONIC)? Se este é composto de Igrejas-Irmãs em condição de Igualdade, a Igreja Católica Romana negará a aceitação do documento Dominus Iesus ou as demais igrejas aceitarão uma condição de inferioridade?”
[Artigo Considerações sobre o documento “Dominus Iesus”, disponível em http://www.swbrazil.anglican.org/consideracoes.htm]
Peço desculpas aos amigos leitores pela demorada exposição, mas era necessário discorrer sobre todos esses pontos, haja vista a complexidade do tema (sejamos honestos, não dá para falar de coisas sérias com leviandade).
Quero, portanto, propor um novo desafio ao grupo. Qual a opinião de vocês sobre o que acaba de ser exposto?
E aí, inquietos?
Meus caros inquietos, o que aconteceu com vocês? resolveram sumir, todos. Atendamos ao Amigo de Deus e; avante!
\"Alegrai-vos no Senhor, alegrai-vos\"
Amigo de Deus,
Não entendi muito bem, o recado do Sinézio. Você pode explicar?
No momento, há quatro outros colegas on line, de olho em nossa conversa. Peço que se apresentem e participem do abrilhantado diálogo que se trava nesse espaço.
Não há o que desculpar, meu velho. \"Alegrai-vos no Senhor, alegrai-vos\"
Amigo de Deus,
Peço desculpas por minha colocação. Agora está tudo esclarecido.
\"Alegrai-vos no Senhor, alegrai-vos\"
Irmão Alegria, lamento se eu não fui suficientemente claro em minhas colocações. É evidente que não me referi a alegria como um reles aroma de esperança. Quis apenas deixar claro que quem luta em prol do Reino da Justiça e da PAz é semelhante àquele que antecipa o sublime frescor da primavera, cultivando o terreno das flores que um dia haverão de florescer viçosas em nossos jardins. Tudo esclarecido?
Amigo de Deus,
Não entendi muito bem o seu recado. Tive a impressão que estava se referindo a alegria como um leve aroma de esperança. A alegria do senhor é a verdadeira e única alegria. Ainda não a encontraste?
\"Alegrai-vos no Senhor, alegrai-vos\"
? ? ? ? ? ?