Sermões

Alguns trechos dos Sermões de Santo Antônio, Presbítero e Doutor da Igreja

Sobre palavras e obras

Quem está repleto do Espírito Santo fala várias línguas. As várias línguas são os vários testemunhos sobre Cristo, a saber: a humildade, a pobreza, a paciência e a obediência; falamos estas línguas quando os outros as veem em nós mesmos. A palavra é viva quando são as obras que falam. Cessem, portanto, os discursos e falem as obras. Estamos saturados de palavras, mas vazios de obras. Por este motivo o Senhor nos amaldiçoa, como amaldiçoou a figueira em que não encontrara frutos, mas apenas folhas. Diz São Gregório: “Há uma lei para o pregador: que faça o que prega”. Em vão pregará o conhecimento da lei quem destrói a doutrina por suas obras.

Sobre os perigos que ameaçam os homens

Este nosso mundo tem imensa e urgente necessidade do calor de Deus que ilumina e vivifica. Pois está doente, mas não encontra remédio para os seus males: está angustiado, porque sente, por um lado, a inutilidade dos bens terrenos, mas, por outro lado, não sabe esperar nos bens eternos. Está amedrontado e impotente, enquanto o demônio o ataca sem piedade e o arrasta para a perdição, mas não sabe se desvencilhar das cadeias com que ele o acorrentou.

Sobre a Igreja de Cristo

Cristo saiu do seio do Pai e veio ao mundo para semear e fundar a sua Igreja, na qual se conservasse uma semente incorruptível e viva através dos séculos.

Uma vez que Cristo, nosso bom samaritano, não devia permanecer mais tempo sobre a Terra, após a sua ressureição, confiou-nos aos cuidados dos apóstolos, em cujas mãos colocou os dois testamentos, explicando-lhes o sentido, para que pudessem guiar e dirigir o povo cristão.

Vivamos dentro da Igreja como o pássaro no seu ninho. Tomemos cuidado para não sair dela senão na hora de arrancar o nosso voo para o paraíso: “Dá-me a graça, Senhor, de morrer dentro do meu ninho” (Jó 29, 18). Que cada um dos cristãos suplique a graça da perseverança na fé, dizendo: Concede-me, ó Pai do céu, a graça de viver e morrer com a fé dos apóstolos e da tua santa Igreja Católica!

Sobre a Oração

A oração é o coração que se eleva, o coração elevado. Assim é o coração de alguém que ama, de alguém que tem desejos ardentes, de alguém que contempla. Quem reza, assemelha-se a um pássaro que orienta o voo para as alturas; da terra desprende o voo e vai se imergir nos espaços celestes.

O Senhor se manifesta àqueles que se recolhem na paz e humildade do coração. Numa água suja e agitada não aparece o rosto de quem ali for se espelhar. Portanto, se desejas que a face de Cristo se retrate na tua face, então pare, recolhe-te em silêncio, feche as portas da alma ao barulho das coisas exteriores.

Deus jamais deve sair da nossa mente, da mesma forma com que não existe um só instante em que não estejamos sendo objeto da sua solicitude.

Sobre o Espírito Santo

Os apóstolos, entretanto, falavam conforme o Espírito Santo os inspirava. Feliz de quem fala conforme o Espírito Santo lhe inspira e não conforme suas ideias! Pois há alguns que falam movidos pelo próprio espírito e, usando as palavras dos outros, apresentam-nas como suas, atribuindo-as a si mesmos.

Falemos, portanto, conforme a linguagem que o Espírito Santo nos conceder; e peçamos-lhe humilde e devotamente que derrame sobre nós a sua graça, a fim de podermos celebrar o dia de Pentecostes com a perfeição dos cinco sentidos e na observância do decálogo. Que sejamos repletos de um profundo espírito de contrição e nos inflamemos com essas línguas de fogo que são os louvores divinos. Desse modo, ardentes e iluminados pelos esplendores da santidade, mereceremos ver o Deus Uno e Trino.

Sobre a avareza e a luxúria

Infeliz do homem que cobre sua cabeça com a nuvem das riquezas, como se quisesse se consolar! Ao se cobrir com essa nuvem, ele está se privando do conhecimento e da lembrança de Deus, uma vez que, infelizmente, as coisas temporais só nos fazem esquecer a Deus. Os avarentos, ao buscar as coisas temporais, jogam a fé em Cristo e a graça do Batismo no monturo das riquezas. Amontoar riquezas só traz amargura, que logo causa tribulações e sofrimentos.

Já a cegueira da luxúria pode ser curada pela amargura da Paixão de Cristo. Disse um sábio que a lembrança do Crucificado crucifica todo vício. Deves, portanto, mergulhar os momentâneos prazeres da carne na amargura da Paixão de Cristo.

Sobre a Santíssima Virgem Maria

Maria é a estrela do mar. Se esta estrela não te ilumina, depois que seu barco for destroçado pela tempestade, acabarás por afundar no meio das ondas.  Estamos, de fato, em alto-mar, agitados pelas ondas e, por isso invocamos a Estrela do mar, para poder chegar com sua ajuda ao ponto da eterna salvação. É ela que nos livra da tempestade, que nos indica a rota salvadora e que orienta até o porto.

Da Virgem fecundada pelo Espirito Santo jorra sobre o mundo como que uma torrente de graças. É que Maria deu à terra o Autor de todas as graças: Nosso Senhor Jesus Cristo. Ela é a Estrela da manhã. A mais reluzente dentre todas as estrelas que cintilam é aquela que precede e anuncia o sol. Ela surge entre as nuvens para dissipá-las, anunciando, ainda de madrugada, o Sol da santidade e da justiça a todos os homens imersos nas trevas... A glória da Virgem, portanto, é seu Divino Filho Jesus.

Ergamos, então, também nós a nossa voz e digamos a Jesus: “Feliz e gloriosa a tua Mãe! Sim, feliz o ventre que ti carregou, e os seios que te amamentaram!”.

Sobre a escuta da Palavra de Deus

São os pobres, os simples, os humildes aqueles que têm sede da Palavra da Vida e da água da Sabedoria. Porém os mundanos, que se embriagam com o cálice dourado dos vícios, os sabichões, os conselheiros dos poderosos (acreditem-me, se puderem!) não aceitam que se lhes anuncie a Mensagem Divina. Escutar de boa vontade a Palavra de Deus é um grande sinal de predestinação. Da mesma forma com que o exilado procura e escuta com satisfação notícias provenientes da sua terra, também se pode dizer que já tem o coração voltado para o céu o cristão que escuta com interesse quem fala da pátria celeste.

Sobre o Sacramento da Confissão

O Sacramento da Penitência é denominado “casa de Deus”, porque nele os pecadores se reconciliam com ele, assim como o filho pródigo se reconciliou com o pai, que o aceita de novo em sua casa. Também é denominado “porta do céu”, porque, graças à confissão, o penitente é aceito em casa para beijar os pés, as mãos e a face do Pai celeste. Oh, casa de Deus! Oh, confissão, porta do céu! Feliz daquele que mora na tua casa, que é admitido na tua casa! Inclinai-vos humildemente, meus irmãos, e entrai por esta porta sagrada!

A confissão, quando nascida da contrição, pode ser denominada “regeneração”. A alma é purificada dos pecados manifestados integralmente ao sacerdote e a consciência se ilumina ao serem derramadas as lágrimas do arrependimento.

Na confissão, acompanhada de arrependimento e satisfação, se obtêm o perdão dos pecados, a infusão da graça e a remuneração da vida eterna. A confissão eleva a alma até Deus.

Sobre a Santíssima Eucaristia

Devemos crer firmemente e professar abertamente que aquele mesmo corpo que nasceu da Virgem, que foi pregado na cruz, que descansou no sepulcro, que ressuscitou no terceiro dia e que subiu à direita do Pai é realmente o mesmo que foi dado em alimento aos apóstolos na última ceia e o mesmo que a Igreja verdadeiramente consagra todos os dias na Santa Missa, distribuindo-o aos fiéis. De fato, ao serem pronunciadas pelo sacerdote as palavras: “Isto é meu corpo”, o que antes era pão se transubstancia no Corpo de Cristo.

E foi verdadeiramente seu Sangue que ele deu de beber a seus apóstolos quando disse: “Este é o cálice do meu sangue, o sangue da nova e eterna Aliança, que será derramado por vós e por todos para remissão dos pecados...” E assim foi realmente o seu sangue que, com suas mãos santíssimas, ele ofereceu à Igreja, sua dileta esposa, este sangue que no dia seguinte ele derramou pelos pecadores.

Os que recebem dignamente o Corpo de Cristo têm o fruto de dupla riqueza: mitiga as tentações e desperta o fervor; suaviza as amarguras e alimenta a devoção; por isso é comparado, no livro do Deuteronômio, com aquela “terra que produz leite e mel”. Este é o pão com que Jesus presenteou seus apóstolos e que os tornou vitoriosos no meio dos sofrimentos.

Quem quiser se alimentar dignamente do Corpo de Cristo sujeite o seu corpo às restrições de castidade, fortaleça os seus sentimentos com o exemplo dos santos e traduza em obras as suas palavras...

Como então os filhos de Israel, por ordem de Deus, comiam na festa da Páscoa judaica o cordeiro pascal com ervas amargas e agrestes, assim nós também comemos o Cordeiro imolado por nós na cruz, vítima de reconciliação com Deus pelos pecados dos homens, temperado com a amargura do nosso arrependimento.

Sobre o Mandamento do Amor

Já que a caridade é mais importante do que as outras virtudes, procuremos pôr em evidência alguns dos seus aspectos... O amor para com Deus e o amor para com o próximo são a mesma forma de amor, porque Deus é caridade, isto é, Amor. Este mandamento, segundo o qual deves amar a Deus por ser quem ele é e ao próximo como a ti mesmo, foi determinado por Deus e deves praticá-lo com a mesma intenção e pelo mesmo motivo pelo qual tens de amar a ti mesmo.

Deves amar a ti mesmo dentro do bem e por causa de Deus; o mesmo deves fazer em relação ao teu próximo. E deves considerar como teu próximo todo e qualquer ser humano, porque não existe nenhum com o qual se possa proceder mal.

Como é que se deve amar a Deus? Assim: Amarás o Senhor teu Deus de todo o coração, isto é, com toda a inteligência; com toda a alma, isto é, com a tua vontade; com toda a mente, isto é, com a memória, de maneiras que concentres todos os pensamentos, toda a vida, toda a inteligência naquele do qual recebes o que lhe ofereces.

Com o que acabou de dizer, Jesus não deixou livre, então, nenhuma parcela da nossa vida: tudo o que nos vier à mente deve ser dirigido para onde corre o impulso do nosso amor.

Sobre o Santo Padre

Em nome de Cristo, o Papa não cessa de providenciar diariamente para seus filhos o alimento espiritual, pregando continuamente sobre a glória do céu que nos espera e sobre a necessidade de o merecermos pela penitência... Ouçamo-lo! Peçamos a Jesus que nos conceda a graça de ingressar obedientes e de viver na barca de Simão Pedro.

Essa é a barca da Igreja, cujo timão é dirigido pelo Papa. Jesus a confiou aos seus cuidados, pesando sobre seus ombros uma grave responsabilidade. Triste seria se o piloto fosse inexperiente e distraído; se, em vez de seguir a rota certa, fosse dar nos baixios; se não fosse capaz de evitar os escolhos e de chegar a salvo com todos os que transporta.

Sobre a gravidade do pecado

A rebeldia e desobediência a Deus nos transformam em filhos péssimos e degenerados. Ao nos criar, o Senhor estampou em nossa alma a sua divina imagem, da mesma maneira com que um pai da terra transmite aos filhos as suas próprias feições. Pois bem, aquela imagem e semelhança com Deus nós a perdemos ao cometer um pecado grave. Pior do que isso, nós chegamos a substituir aquela imagem de Deus pela do próprio demônio. É exatamente isto! Cada vez que um cristão comete um pecado grave, imprime em sua alma a imagem de Satanás, fazendo-se semelhante a ele, tornando-se seu filho.

Quem vai contra Deus, vai contra si mesmo; quem renega a Deus, está renegando a si mesmo. É que a arma do pecador se volta contra ele mesmo, para feri-lo de morte. Nós chamamos de morte a separação entre a alma e o corpo, mas a verdadeira morte acontece quando o homem se separa de Deus pelo pecado. A morte física não passa de uma sombra, comparada à morte espiritual.

O pecado deve parecer para nós o que realmente é: um ato abominável impregnado de tríplice malícia, pois ofende a Deus, dá a morte a quem o pratica e escandaliza o próximo. Dessa forma, a justiça é violada de três maneiras, pois se recusa a honra devida a Deus, prejudica-se nossa própria vida e se nega o amor ao próximo.

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